O sol estava quase se pondo no horizonte, quando terminei de
cumprir minhas tarefas. Seus raios mesclavam-se com o céu, gerando uma luz
lilás que envolvia as nuvens e eram refletidas no Grande Lago de águas
cristalinas. Voei acompanhando os raios lilás, com as borboletas dançando ao
meu redor. Uma delas pousou em meu dedo, fazendo cócegas em minha pele.
- Que belo dia foi este, flor dançante - falei, num sorriso
- Tenho certeza que a noite chegará linda e cheia de estrelas.
A borboleta abriu e fechou as asas, voando em seguida,
acompanhando suas irmãs no último voo do pôr do sol. Continuei voando, até me
aproximar da floresta. Esta noite eu tinha uma missão, escolhida por mim.
Voltei ao solo, recolhendo minhas asas. Ouvi um pio, minha
fiel companheira estava há poucos metros de mim, em cima de um galho. Observei
os olhos daquela coruja, que me diziam "vá em frente!"
- Tens razão, querida amiga. Hoje eu vou descobrir o
mistério daquele lobo.
Outro pio. É, irei em frente, sem medo.
Adentrei a floresta de árvores enormes e fortes, que
aproveitavam os últimos raios solares do dia. Havia pequenos coelhos, lebres e
cordeiros indo para suas tocas e esconderijos. Acariciei uma rosa vermelha que
se fechava para o frio da noite. Sorri, com ternura. Como a natureza é perfeita
e bela!
Foi mais ou menos neste mesmo lugar que encontrei o lobo das
outras vezes. Com cuidado, voei até o topo de uma árvore, onde me escondi para
esperar o belo animal aparecer. Observei atentamente, entre o emaranhado de
folhas e galhos, até que encontrei aquele misterioso brilho, que já me parecia
familiar. O lobo caminhava calma e majestosamente, exibindo todo seu esplendor.
O vento soprou uma brisa leve, bagunçando seu pelo prateado e eu pude jurar que
vi centelhas de luz prateada, bagunçadas pela brisa, voarem e grudarem nas
árvores, desaparecendo segundos depois.
Fiquei hipnotizada, novamente, com tanta magia que aquele
animal realizava, quase inconscientemente. Eu possuía alguma magia, mas era
vital, curadora... Era assim que eu realizava o auxílio aos animais feridos e
revigorava a força das árvores. Mas aquele lobo... Eu sentia minhas asas
vibrarem na presença de tamanho poder e tamanha energia, tão puros e simples.
Não era um animal comum, repito. E eu estava prestes a descobrir o que era de
verdade.
O lobo uivou, depois, caminhou com passos calmos até a parte
da floresta onde as árvores eram mais densas e mais unidas. Eu o segui. Ao
longo do percurso, encontramos uma lebre caída no chão, à beira da morte. Imediatamente,
eu quis ajudar o pobre animalzinho que sofria convulsões no meio das raízes de
um grande salgueiro, mas contive, resolvendo aguardar o lobo se afastar. De
repente, o Lobo se aproximou da lebre e inacreditavelmente, fungou-lhe a face.
O pequeno animal suspirou e as convulsões pararam. Acreditei que estava morto,
que aquele estranho lobo havia terminado de matar um pobre animal para saciar
sua fome, sua ganância. Me revoltei, acabando com toda a admiração que tinha
por aquele animal. Então, antes que eu fizesse qualquer coisa, a pobre lebre
levantou a pequena cabeça, esforçando-se para erguer o restante do pequeno
corpo. Percebi então, que o lobo não a matara, mas a tinha curado, como eu tive
a intenção de fazer. Céus, perdoem meu julgamento e minha intolerância!
Assim como a admiração havia me fugido, depois daquele
magnífico feito, ela voltara ainda mais forte.
Repentinamente, o lobo virou a cabeça na minha direção, como
se soubesse que eu estava ali o tempo todo. Não sei como aconteceu, mas senti seus
olhos enxergando dentro de mim, absorvendo tudo sobre a minha presença. Sem
muita consciência do que estava fazendo, desci da árvore, enquanto o lobo ainda
me observava atentamente. Não me aproximei, manti uma distância segura entre
nós. Apesar de toda a admiração, aquele animal me intimidava.
O lobo, então, deu um passo na minha direção, mas me mantive
quieta, prestando atenção. Ele fechou os olhos, como quem se preparava para se concentrar
em algo muito importante. Centelhas prateadas, semelhantes àquelas que grudaram
nas árvores, saíram novamente de seu pelo, mas dessa vez formaram imagens
nítidas e que me pareceram estranhamente familiares. Fatos da minha vida como
humana passaram por aquelas imagens... O brilho do meu olhar, meu riso alegre,
os amigos que deixei para trás, minhas lágrimas de decepção, minha maldade
incontrolada e meu pedido de perdão aos Céus. Cenas de minha vida como fada
também passaram pelas imagens: meus voos saltitantes, meu riso melódico ao
conversar com os pequenos amigos, minhas curas dos animais, minha manipulação
de energia vital... Vi também vários crepúsculos onde eu me escondia e
observava este mesmo lobo, que me mostrava que há muito tempo também me
observava.
O incrível animal abriu os olhos, me libertando do transe. Com
lágrimas nos olhos, e sem pensar, corri até ele o abracei, quase afundando o
rosto em seus pelos prateados.
Como se ainda fosse possível algo mais mágico acontecer,
ouvi uma voz grave e bonita na minha cabeça:
- Eu sabia que viria atrás de mim, pequena fada. Eu conheço
a tua história, sei do teu valor.
Me afastei alguns centímetros do animal e o fitei,
imensamente impressionada:
- Como fazes isso? - murmurei, tocando o focinho dele com
uma das mãos. Ele fechou os olhos - Quem és tu?
O lobo deu um passo para trás e uma névoa se formou ao seu
redor. Num piscar de olhos, toda a névoa desapareceu, junto com o animal, dando
lugar a um homem alto, de cabelos castanhos na altura do pescoço, com
brilhantes olhos azuis.
- Meu nome é Aron - disse o homem - Sou o príncipe dos
Elfos. Tenho uma missão para contigo, assim como tu tens uma missão para
comigo. Há um fio invisível que nos une e nós temos de terminar o que foi
começado há milênios atrás. Há uma missão para cumprirmos juntos.
Eu mal havia entendido o que aquele elfo de nome Aron havia
dito, mas eu estava feliz por finalmente ter descoberto que aquele lobo era
mais que um animal e que havia essa estranha ligação entre nós. Se eu estava
sonhando, eu não sabia, mas me sentia fascinada com tudo que havia acontecido,
com tudo que meus olhos haviam visto. Que missão seria essa? Eu não fazia ideia,
mas iria cumprir, se fosse a vontade dos Céus.
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